PNE
completa um ano, mas ainda não saiu do papel
(Valor
Econômico-SP, 24/06/2015)
Um
ano após ser sancionado pela presidente Dilma Rousseff, o Plano Nacional de
Educação enfrenta dificuldades para sair do papel e ser implementado. As
primeiras exigências da lei, que deveriam ser cumpridas até a data de hoje, não
foram executadas de forma satisfatória, na visão da Campanha Nacional pelo
Direito à Educação, que lançou esta semana um manifesto em que define a
situação do plano como "inquietante".
"É
preciso que se compreenda que toda e qualquer medida do PNE - seja uma meta,
estratégia ou demanda definida nos artigos da lei - depende da realização de
outra. É uma lei totalmente encadeada, que precisa ser cumprida degrau a
degrau", afirma o texto, que marca o lançamento da Semana de Ação 2015,
cujo tema é o primeiro ano de vigência do PNE e prevê atividades e debates pelo
país.
"Lamentavelmente,
a qualidade de implementação do PNE é muito baixa", diz o documento, que
agrega a opinião de entidades como Ação Educativa, ActionAid Brasil, Centro de
Defesa da Criança e do Adolescente do Ceará (Cedeca-CE), Confederação Nacional
dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Associação Nacional de Pesquisa em
Financiamento da Educação (Fineduca), Fundação Abrinq pelos Direitos da Criança
e do Adolescente, e União Nacional dos Dirigentes Municipais de Educação
(Undime).
Daniel
Cara, coordenador-geral da Campanha e que participou de perto dos quase quatro
anos de discussões até que o PNE fosse criado e aprovado pelo Congresso, é um
dos críticos que apontam descaso do governo federal em relação ao plano.
"Desde
a sanção, que foi feita sem cerimônia ou celebração pela presidente, nunca
houve a indicação de que o plano é uma prioridade", afirma Cara.
"Qualquer avaliação sincera concluirá que muito pouco foi feito, e
praticamente nada foi adequadamente debatido", afirma o coordenador.
Segundo ele, qualquer falha no processo de implementação do plano prejudica o
resultado final.
O
ano de 2015 tampouco está fácil, na perspectiva do Plano Nacional de Educação.
Além do ajuste fiscal, da crise econômica e dos desdobramentos políticos da
Operação Lava-Jato, que desviam o foco das metas educacionais, este ano trouxe
também uma espécie de "fogo amigo" sobre o PNE. O documento
"Pátria Educadora", proposta elaborada pela Secretaria de Assuntos
Estratégicos da Presidência da República (SAE), tem sido apresentado a
especialistas e deputados pelo ministro Mangabeira Unger, que chefia a pasta,
como uma série de ações que transformariam em realidade o "slogan"
escolhido como principal bandeira para o segundo mandato de Dilma.
Entre
essas ações estão o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) on-line, a utilização
de tecnologias em sala de aula e a criação de uma variante do Programa
Universidade para Todos (ProUni), o Profaped, que se destinará a conceder
bolsas a estudantes nos cursos de pedagogia e de licenciatura.
O
documento foi recebido com estranheza entre os especialistas em educação, já
que, em um momento em que se deveria unir forças em torno do PNE, a proposta de
Unger pouco dialoga com o plano.
Questionado
pelo Valor sobre a possível divergência entre as pastas, Binho Marques, da
Secretária de Articulação com os Sistemas de Ensino (Sase), do Ministério da
Educação, foi enfático ao reforçar a prioridade do PNE na agenda da educação.
"Do ponto de vista do Ministério da Educação e do próprio governo como um
todo, isso não é uma alternativa ao PNE de maneira nenhuma", afirmou o
secretário, que disse que o comportamento de Unger, ao rivalizar o debate em
temas de outras pastas não é inédito, dado que o ministro é um "intelectual"
e gosta de acompanhar os assuntos importantes ao país.
"O
ministro Mangabeira costumava discutir a Amazônia em uma época em que já havia
o ministério do Meio Ambiente. Eu acompanhava, porque era governador do Acre, e
ele rivalizava o debate. Isso de maneira nenhuma confronta o PNE, que é amplo e
não aprofunda o debate nos temas", disse, destacando que a educação é um
tema de toda a sociedade e quanto mais gente participar do debate, melhor.
"Eu acho que nem o ministro Mangabeira está tentando substituir uma coisa
por outra, não acho que seja o caso. Talvez ele pudesse ter dado um enfoque
maior ao PNE", diz Marques.
Procurada
pelo Valor, a Secretaria de Assuntos Estratégicos afirmou que o projeto Pátria
Educadora não pretende substituir o PNE e, ao contrário, "traz importantes
aportes para implementá-lo". Em nota, a SAE afirma que não tem papel
normativo nem executivo, mas tem a missão de propor soluções para os grandes
problemas nacionais.
"A SAE está desdobrando algumas propostas
sobre cooperação federativa, sobre o ideário de um novo currículo, sobre a
formação de professores e diretores e a utilização de tecnologias avançadas na
educação. Nada disso está explicitado no PNE. Nesse sentido, o Pátria Educadora
só ajuda a implementar o PNE", afirma a nota.
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